quarta-feira, 8 de julho de 2009

UTILIZAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA E CAUTELARES NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

1- COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS

O artigo 98, inciso I da Constituição Federal determinou que a União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão os Juizados Especiais, cuja competência será para conciliação, julgamento e execução das causas cíveis de menor complexidade, mediante procedimento oral e sumaríssimo.

Em 1995 entrou em vigor a Lei 9.099 que revogou as leis 4.611/65 e 7.244/84 e veio regulamentar qual seria a competência e o procedimento para a utilização desta justiça especial.

No artigo 3º a lei determinou que sua competência se daria às causas cíveis de menor complexidade, dentre as quais:

I- as causas cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo;
II- as enumeradas no art. 275, inciso II, do Código de Processo Civil;
III- a ação de despejo para uso próprio;
IV- as ações possessórias sobre bens imóveis de valor não excedente ao fixado no inciso I deste artigo;

E, tratou de excluir de sua competência, no § 2º, as causas de natureza alimentar, falimentar, fiscal e de interesse da Fazenda Pública, e também as relativas a acidente de trabalho, a resíduos e ao estado e capacidade das pessoas, ainda que de cunho patrimonial.

Como se observa, o legislador ao restringir a competência "ratione materiae" do juizado utilizou-se de um rol taxativo, não fazendo nos artigos da lei qualquer restrição quanto ao tipo de processo, apenas determinando que o procedimento seria o sumaríssimo.

2- PROCESSO E PROCEDIMENTO

Diante disso, mister se faz a distinção entre processo e procedimento. De uma forma simplificada, processo é o instrumento que dispõem às partes e o Estado para a solução de litígios através da jurisdição. Procedimento é a forma pelo qual os atos processuais se movimentarão para se chegar à tutela jurisdicional.

O processo pode ser de conhecimento, execução, cautelar e, para alguns autores, mandamental. Quem pode legislar sobre processo é exclusivamente a União Federal, conforme o artigo 22, inciso I da Constituição Federal e, sobre procedimento, a União Federal, os Estados e o Distrito Federal, de forma concorrente, nos termos do artigo 24, inciso XI da Carta Magna.

Feita esta distinção, voltemos à Lei 9099/95 para analisar, em seu bojo, que há apenas o dever legal de observância ao procedimento, que dentre os seus princípios encontram-se a celeridade, informalidade, oralidade e economia processual, com o fito de tornar mais rápida a solução de litígios que se enquadrem dentro de sua competência.

O processo no juizado, pelo que reza seu conteúdo, tanto pode ser o de conhecimento como o de execução, no qual dentro deles encontram-se procedimentos específicos que o diferenciam dos previstos no Código de Processo Civil. No entanto, a lei silencia sobre o processo cautelar, mas isso não significa que ele esteja excluído da competência dos juizados, conforme Cândido Rangel Dinamarco: " As medidas cautelares têm um sentido de guerra contra o tempo, que muitas vezes é inimigo declarado do processo e da utilidade do seu produto (Carnelutti), o que torna natural a sua admissibilidade, em tese, nesse órgão jurisdicional intensamente voltado à celeridade no atendimento aos reclamos de violação de direitos." (Manual dos Juizados Especiais Cíveis - 2ª edição - pág. 90 - Malheiros)

3- PROCESSO CAUTELAR

O artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal reza que nenhuma lesão ou ameaça a direito será excluída de apreciação do Poder Judiciário e assim comenta Nelson Nery: "Todos têm acesso à justiça para postular a tutela jurisdicional preventiva ou reparatória de um direito individual, coletivo ou difuso. Ter direito constitucional de ação significa poder deduzir pretensão em juízo e também poder dela defender-se. A facilitação do acesso necessitado à justiça, com a assistência jurídica integral (CF 5º LXXIV), é manifestação do princípio do direito de ação. Todo expediente destinado a impedir ou dificultar sobremodo a ação ou defesa no processo civil constitui ofensa ao princípio constitucional do direito de ação. É preciso, contudo que a parte preencha as condições da ação (CPC 267 VI) para que possa obter sentença de mérito". (Código de Processo Civil Comentado, 2º edição, p. 136, Revista dos Tribunais).

Desse modo a Constituição Federal garante que além da lesão, a ameaça também não poderá ser excluída da apreciação do Poder Judiciário.
Em se tratando das lesões que se enquadrem na competência do artigo 3º da Lei 9.099/95, o legislador garantiu um procedimento célere para suas soluções. E a ameaça a estas mesmas lesões? O legislador sequer fez qualquer ressalva, pois como é cediço, casos há em que a parte poderá estar na iminência de sofrer uma lesão e que mesmo com a celeridade do procedimento da lei não será possível evitá-la.
Neste caso, em atenção ao princípio da inércia estampado no artigo 2º do Código de Processo Civil, a parte deverá provocar o juiz para que preste a tutela jurisdicional. Esta prestação se dará através de um processo cautelar anterior ou no curso do processo principal, pois visará a este resguardar.

A finalidade do processo cautelar é assegurar o resultado do processo de conhecimento ou do processo de execução, tendo característica acessória. É importante ressaltar que não há qualquer vedação a este processo na lei 9099/95.

Desta forma, sempre que houver a necessidade de se evitar uma ameaça a direito, nada obsta o ajuizamento inicial ou incidental de um processo cautelar que, dentre outras características, também se encontram a sumariedade de rito e a urgência, perfeitamente compatíveis com o rito do juizado. E, caso esteja presente o "fumus boni iuris" e o "periculum in mora" de ameaça a direito, o juiz deve conceder a liminar.

4- TUTELA ANTECIPADA

A reforma do Código de Processo Civil veio a introduzir em nosso direito a tutela antecipada, distinguindo-a das cautelares satisfativas que há muito estavam sendo usadas de forma errônea.

A tutela antecipada será concedida total ou parcialmente, sempre que: existir prova inequívoca; que o juiz se convença da verossimilhança das alegações; que haja fundado receio de dano irreparável; que fique caracterizado abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu. E, ainda, que tal provimento não poderá ser concedido quando houver perigo de irreversibilidade do provimento antecipado.

Sua natureza jurídica é de execução, pois visa entregar ao Autor, total ou parcialmente, a própria pretensão deduzida em juízo ou seus efeitos. Diferente da natureza cautelar que visa, sim, resguardar o direito afirmado pelo autor no processo principal.

Um exemplo disso é a situação de um sujeito que quer do Poder Judiciário uma desconstituição de uma relação jurídica fundada em um título. Este sujeito hipotético poderá utilizar-se do juizado especial cível se o valor do título não superar 40 salários mínimos. Rito este que lhe trará uma rápida prestação jurisdicional. Porém, corre o risco de que neste ínterim da solução da lide, tenha seu nome negativado pelo credor. Qual o caminho a ser seguido?

Segundo alguns magistrados é inviável a utilização do processo cautelar com o fito de determinar, preventivamente, a não negativação do nome do sujeito, pois entendem que os "ritos são incompatíveis". Outros são mais radicais, não admitem nem o processo cautelar, nem a tutela antecipada, mesmos que seus requisitos estejam bem demonstrados. É importante ressaltar que em nenhuma das hipóteses há uma fundamentação convincente, apenas o tão famoso: "...ausente os requisitos, indefiro a pretensão..." ou " ... incompatível com o rito, indefiro a pretensão".

E como fica o "sujeito"? Terá que ficar com o nome negativado até a sentença do juiz de primeiro grau ou o acórdão do Colégio Recursal? Entendo que tecnicamente não, vez que, em primeiro lugar, não há vedação legal para a utilização do processo cautelar no rito da lei 9.099/95, desde que preenchidos seus requisitos o juiz deve conceder a cautela. Em segundo lugar, que mesmo sendo de rito sumaríssimo, os processos nos juizados especiais cíveis são de conhecimento, logo plenamente cabível o pedido de antecipação da tutela, salvo nos processos de execução.

Outro exemplo clássico é o fato de que se um sujeito necessita, para exercer seu direito, visando se resguardar de uma lesão ou ameaça, de um documento que está na posse de seu "ex adverso". É cediço que a petição inicial deverá ser instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação, nos termos do artigo 283 do Código de Processo Civil. Ora, se tal documento está na posse da outra parte, a forma adequada de se buscá-lo seria através da Ação Cautelar de Exibição de Documento. Porém, para os juízes que entendem não caber Ação Cautelar no juizado, a inicial seria inepta por falta de documento essencial.


Diante destas barreiras infundadas, o sujeito é forçado a buscar sua tutela através do tortuoso procedimento ordinário, mesmo que sua pretensão não supere os 40 salários mínimos. E, esta não seria a idéia do legislador constituinte e ordinário.

5- CONCLUSÃO

Em suma, pela ausência de vedação legal, como já demonstrado, o mais correto tecnicamente, seria a utilização tanto do processo cautelar como do pedido de antecipação de tutela, preenchidos seus requisitos.

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