terça-feira, 27 de outubro de 2009

A PENHORA NÃO PODE SER CONTESTADA VIA MANDADO DE SEGURANÇA

Não cabe Mandado de Segurança contra ato judicial passível de recurso ou correição. Com base nesse entendimento, da Súmula 267 do Supremo Tribunal Federal, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou seguimento a um Recurso Ordinário em Mandado de Segurança que questionava uma penhora de salário para pagamento de dívida bancária.
A penhora de 30% do salário foi autorizada pelo juízo de primeiro grau em uma ação de execução movida pelo Bradesco, no valor de R$ 25.365,25. A autora do recurso sustentou que o Código de Processo Civil considera os salários absolutamente impenhoráveis e que sua determinação seria absurda, hipótese em que se admitiria o afastamento da Súmula 267 do STF.
A ministra Nancy Andrighi, relatora do caso, ressaltou que, em julgamento ocorrido no ano passado, a 3ª Turma admitiu a impetração de Mandado de Segurança em ato que continha manifesta ilegalidade ou revestido de absurdos, ofendendo direito líquido e certo que poderia causar dano irreparável ou de difícil reparação. Ela concluiu que, embora tenha acompanhado o relator no afastamento da súmula naquela ocasião, deveria rever seu posicionamento.
Segundo a relatora, um alto grau de ilegalidade é exigido como condição para impetração do Mandado de Segurança. Portanto, o ato combatido deve ser teratológico. Com essa análise, a ministra se convenceu de que o advogado precisa de um cuidado diferenciado para tratar dessas questões.
A ministra Nancy Andrighi explicou que o afastamento da súmula do Supremo só é possível quando a interposição do recurso cabível for impedida por circunstância extraordinária que não possa ser superada pela parte. Por entender que não é hipótese do caso julgado, em que, na avaliação da relatora, houve negligência, a 3ª Turma negou provimento ao recurso por unanimidade. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.
COMENTÁRIO
Com o devido respeito à Ministra, mas direito líquido e certo é aquele que pode ser provado imediatamente. Não existe uma graduação do direito líquido e certo. Ou ele está devidamente provado ou não está. Ou existe ou não existe. Não há o que se falar em violação mais ou menos absurda a ensejar a impetração.Não existe isso na Lei 12.016/2009.
O que existe sim, é uma vedação legal à penhora de salário, nos termos do artigo 649, IV do CPC. A única ressalva feita é com relação ao pagamento de prestação alimentícia (art. 649, § 2º, CPC).
Em suma, se o magistrado, numa ação movida pelo Banco, determinou a penhora de 30% do salário, por óbvio agiu contra a lei e seu ato violou direito líquido e certo.
Além disso, a utilização do Mandado de Segurança vem ao encontro do artigo 5º, LXVIII da Constituição Federal, pois é um remédio constitucional muito mais celere do que a tramitação dos recursos em geral.
Quanto tempo durará a tramitação de um recurso, qualquer que seja? Com certeza será um prazo razoavelmente maior do que a de um Mandado de Segurança.
Além disso, é flagrante o absurdo da decisão.
O mal de alguns juízes é quererem interpretar e inovar naquilo que está claro na lei. Os julgamento têm que ser feito com base no caso concreto. Se os julgamentos forem com base em precedentes, para que a figura de um Juiz? Basta digitar o caso concreto no computador e ele fará uma busca de precedentes e o caso está resolvido.
Pensem nisso.

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

MAIS UMA DECISÃO INCONSTITUCIONAL DO STF

O Plenário do Supremo Tribunal Federal arquivou, nesta quinta-feira (22/10), pedido de Habeas Corpus do desembargador afastado do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) José Eduardo Carreira Alvim. Ele pretendia que fosse determinada a transcrição integral das escutas feitas usadas como prova. O pedido já havia sido negado pelo relator do Inquérito, ministro Cezar Peluso. Nesta quina, a corte aplicou jurisprudência, reafirmada na semana passada, segundo a qual não cabe Mandado de Segurança nem HC contra decisões colegiadas ou monocráticas de ministros do STF.

O desembargador é investigado por favorecimento, em decisões judiciais, a um grupo criminoso ligado à exploração de jogos ilegais, corrupção de agentes públicos, tráfico de influência e receptação. No julgamento, três ministros — Marco Aurélio, Celso de Mello e Gilmar Mendes —, que votaram pelo recebimento do HC, já se manifestaram a favor da transcrição integral de todas as conversas gravadas e usadas como prova para que a defesa possa melhor se defender.

Em junho de 2006, o Plenário havia negado pedido de liminar no mesmo processo e, nesta quinta-feira (22/10), os mesmos ministros que discordaram daquela decisão — o relator, ministro Marco Aurélio; o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, e o decano da corte, ministro Celso de Mello — reafirmaram seu voto, manifestando-se pelo conhecimento do processo, admitindo HC contra ato de ministro do STF, e pela concessão da liminar.

A defesa do desembargador federal questionava ato praticado pelo ministro Cezar Peluso no Inquérito 2.424, que determinou, na fase de defesa prévia, a notificação do acusado para, querendo, oferecer resposta à denúncia no prazo de 15 dias, disponibilizando para a defesa cópia da denúncia e de CD-ROM com as principais peças do inquérito policial.

Insurgindo-se contra essa determinação, a defesa de Carreira Alvim pediu que o STF determinasse a transcrição integral de todas as escutas telefônicas e ambientais nos autos do referido inquérito, bem como que possibilitasse o acesso aos documentos e objetos apreendidos em operação deflagrada pela Polícia Federal (PF), para o oferecimento da defesa técnica. Além disso, pediu a suspensão do mencionado inquérito, até que obtivesse os laudos das gravações telefônicas e captações ambientais, bem como dos objetos e documentos apreendidos.

O relator do processo, ministro Marco Aurélio, chegou a apresentar seu voto pela concessão do HC, antes que o Plenário, por maioria, decidisse por seu arquivamento, sem julgamento de mérito. Ele concordou com o argumento da defesa de que a decisão do relator do inquérito representava ofensa aos princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal, ao não disponibilizar acesso à transcrição integral das escutas telefônicas e ambientais efetivadas nos autos do referido inquérito, bem como aos documentos e objetos apreendidos.
Em seu voto, o relator apontou, também, contradição entre o disposto na Lei 9.386/96, que regula as escutas telefônicas, e a realidade do inquérito. Segundo ele, ao contrário do prazo legal de 15 dias, prorrogáveis por igual período, previsto para a autorização judicial de escutas telefônicas, a Justiça autorizou interceptações que, segundo ele, podem ter demorado anos. E, na hora de disponibilizar as degravações das fitas, alegou que isso seria impossível, pois a degravação completa do resultado das escutas demandaria 40 mil horas de trabalho.

Assim, o texto disponibilizado conteria apenas um resumo feito por agentes policiais que fizeram as escutas e de membros do Ministério Público que elaboraram a denúncia, ou seja, apenas a interpretação deles. Isso, segundo o ministro Marco Aurélio, contraria o próprio espírito da lei, já que as degravações são de mão dupla, na medida em que podem servir tanto à acusação quanto à defesa.
Da mesma forma, ele questionou o fato de, conforme consta dos autos, o procurador-geral da República ter, ao preparar a Ação Penal, selecionado parte das gravações, afastando as conversas íntimas. No entender do ministro Marco Aurélio, esta visão não corresponde à disciplina legal, pois ela delimitaria o acesso da defesa a peças do processo, ao selecionar os trechos transcritos na denúncia.

O ministro Marco Aurélio apontou, entre as principais falhas do inquérito policial contra o desembargador, o fato de não terem formalizado autos apartados ao processo contendo as degravações, a não disponibilização da totalidade das escutas bem como a ausência de elaboração de laudo circunstanciado, conforme previsto na lei. Portanto, sequer foi possível extirpar do conjunto aqueles trechos que nada tinham a ver com o objeto da investigação, disse.

A divergência, que acabou prevalecendo, foi aberta pelo ministro Eros Grau. Ele lembrou que a suprema corte firmou jurisprudência no sentido de não se admitir MS nem HC contra decisões monocráticas de ministros do STF. O ministro Ricardo Lewandowski lembrou que, em outubro do ano passado, ao julgar o pedido de HC 86.548, impetrado pelo ex-juiz federal de São Paulo João Carlos da Rocha Mattos, a corte firmou esta jurisprudência.

A eles associaram-se as ministra Cármen Lúcia e Ellen Gracie e o ministro Carlos Britto. Em sentido contrário, o ministro Celso de Mello, mesmo admitindo que a corte firmara jurisprudência em sentido contrário, votou pelo conhecimento do HC e disse que, se conhecido, votaria por sua concessão, endossando os argumentos do relator, ministro Marco Aurélio.

Reforçando argumento do relator, ele lembrou que o HC em julgamento foi impetrado anteriormente à consolidação da jurisprudência sobre o não cabimento de MS e HC contra decisões do STF e manifestou seu receio diante “da prática que vem sendo utilizada por organizações policiais que culmina com a edição prévia e parcial dos elementos comprobatórios colhidos nas interceptações telefônicas”.

Segundo ele, em alguns casos, “o agente policial agiu como intérprete dos diálogos telefônicos”.
No entender dele, “aí há uma distorção da função policial. Não cabe ao agente agir como tradutor.
Isso subverte a disciplina em matéria de processo comprobatório por meio de interceptações telefônicas”. Ele concluiu afirmando que “prova ilícita é prova juridicamente inidônea, imprestável em juízo”. O ministro Gilmar Mendes, último a votar, disse que manteria seu voto pela admissibilidade do processo, “tendo em vista elementos da segurança jurídica”. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.


COMENTÁRIO

Ultimamente tenho visto decisões do STF que demonstram grandes ofensas ao texto expresso da Constituição Federal.

Esta, por exemplo, ofende o art. 5º, LV,pois como o paciente, seja qual for, poderá exercer sua ampla defesa sem ter acesso a todas as provas constante nos autos?

Segundo as normas processuais, quem determina quais são as provas úteis ou inúteis é o juiz da causa e não os Agentes da Polícia Federal. Que poderes eles têm, além de investigatórios? Nenhum!!!

Aprendemos nos bancos escolares que a interpretação da Constituição deve buscar a maior efetividade da mesma, mas que efetividade é essa que restringe as provas a apenas o que foi selecionado pelos Agentes? O Direito não é uma ciência exata e,portanto, a verdade será construída com uma análise exauriente das provas e, não por mera amostragem.
Sabemos que o remédio heróico do HC é despido do rigor formalista. Se uma decisão liminar do STF numa mera cautelar pode ser combatida com o Agravo Regimental,o porquê não se admitir o uso do MS contra decisão liminar num HC? É um absurdo,falta de lógica, bom senso.

E onde fica o princípio da razoabilidade? Vale mais um rigor formal de um precedente ou uma garantia constitucional da ampla defesa?

Não conheço pessoalmente o paciente, mas ao que parece ele já está pré-julgado e pré-condenado.

sábado, 17 de outubro de 2009

TRANSAÇÃO

1. CONCEITO

É um acordo de vontades no qual os interessados previnem ou terminam um litígio sobre direitos patrimoniais privados ou públicos[1], mediante concessões mútuas. (art. 840, CC).

Tendo em vista que o art. 841 restringe a transação aos direitos patrimoniais privados, vocês deverão ficar atentos ao enunciado da questão. Se o examinador perguntar: segundo o código civil, a transação pode ser sobre direitos patrimoniais públicos? A resposta será não. Todavia, numa questão aberta, é sempre bom demonstrar que você tem um vasto conhecimento e explanar que o art. 156,III do CTN permite a transação sobre créditos tributários que são constituídos de tributos devidos e não pagos, por tanto, receitas derivadas e, por conseqüência, possuem natureza de direito público.

2. ELEMENTOS CONSTITUTIVOS

Cada instituto possui elementos constitutivos que os diferencia dos demais existentes no Direito. Façam uma comparação entre os institutos jurídicos e os seres humanos. Cada um possui elementos constitutivos próprios que os diferenciam no seio da sociedade. Em alguns casos, certas pessoas até possuem elementos semelhantes a outras, mas não iguais. Desta forma, são considerados elementos constitutivos da transação:

a) acordo entre as partes: é o mais óbvio de todos, pois se não houver acordo não há transação. É sempre bom lembrar que as partes, para poderem transacionar, devem ter capacidade civil e, se não tiverem, dependerão de representação[2];
b) existência de relação jurídica controvertida: como as partes chegarão a um acordo se não houver controvérsia? Logo, é imprescindível que exista uma relação jurídica controvertida. Se o acordo já foi firmado[3], se já houve sentença homologatória, se uma pessoa pede algo e a outra concorda, não existe possibilidade de transação;
c) “animus” de extinguir a dívida prevenindo ou terminando o litígio: ao invés de ficar discutindo quem tem mais ou menos direito, a transação pressupõe a mútua intenção de se evitar processos judiciais ou se já existentes, que os mesmos não se perdurem;
d) Concessões recíprocas: Para que exista um acordo, mister que as partes façam mútuas concessões, mostrando racionalidade e bom senso.

3. NATUREZA JURÍDICA

Há várias correntes que tentam definir a natureza jurídica da transação, mas entendo que a mais acertada, sem desmerecer as vozes contrárias, é que a transação tem natureza de acordo que, por sua vez, é um negócio jurídico, ou seja, tem natureza contratual, tanto é que a transação está disposta no capítulo referente às espécies de contratos.

É importante ressaltar que e uma espécie de contrato que tem uma finalidade especial, qual seja, a extinção de uma obrigação.

4. ESPÉCIES

A transação poderá ser feita de forma extrajudicial ou judicial. No primeiro caso, as partes previnem um litígio e homologam, por termo público ou privado, o acordo. Nesta hipótese a transação produzirá efeitos independentemente de homologação judicial. Já no segundo caso, as partes fazem mútuas concessões e, com isso, o juiz acaba homologando o acordo e extinguindo o processo, com resolução do mérito, nos termos do artigo 269, III do CPC.

Carlos Roberto Gonçalves entende que a transação será judicial se feita no escritório dos advogados e homologada em cartório, por instrumento público, por envolver direito imobiliário. Com a devida vênia ao Ilustre doutrinador, não concordo com tal posição, pois onde se encaixaria o judicial no caso? Judicial, ao meu ver, é algo feito perante o Poder Judiciário. Os cartórios são órgãos extrajudiciais, apesar de serem delegatários do Poder Judicial.

5. FORMA

A homologação da transação extrajudicial, conforme já citado, poderá ser feita por instrumento particular, ou quando a natureza do negócio exigir, por escritura pública. Em se tratando de transação judicial ela será por escritura pública ou por termo nos autos, sempre sendo homologado pelo juiz.

6. OBJETO

Conforme já dissemos acima, o artigo 841 do Código Civil só admite transação de direitos patrimoniais privados, ao qual já demonstramos nossa discordância.

Desta forma, são inadmissíveis de transação os direitos indisponíveis, tal qual os relativos ao estado e a capacidade das pessoas e os direitos personalíssimos.

Os alimentos, enquanto direito do alimentado, não podem ser transacionados,por serem indisponíveis, mas o valor do mesmo pode ser negociado.

7. INTERPRETAÇÃO

Os termos da transação devem ser interpretados de forma indivisível, de modo que qualquer cláusula nula, nulifica a transação[4].

A transação só se anula por dolo, coação, ou erro essencial quanto à pessoa ou coisa controversa.

A transação não se anula por erro de direito a respeito das questões que foram objeto de controvérsia entre as partes.

Por outro lado, não havendo cláusulas nulas, estas devem ser interpretadas de forma restritiva, pois possuem um caráter declaratório de vontade das partes, como dispõe o artigo 843 do Código Civil.

8. EFEITOS

A transação se limita às partes, não aproveitando, nem prejudicando senão aos que nela intervierem, ainda que diga respeito a coisa indivisível.

Se for concluída entre o credor e o devedor, desobrigará o fiador.

Se entre um dos credores solidários e o devedor, extingue a obrigação deste para com os outros credores.

Se entre um dos devedores solidários e seu credor, extingue a dívida em relação aos co-devedores.

9. EVICÇÃO

A evicção é a perda de uma coisa por decisão judicial que a conceda a outra pessoa. (vide arts.447 a 457 do CC).

Se uma obrigação tem por objeto uma determinada coisa, no qual uma das partes a renuncia ou transfere a outrem e esta coisa, após homologada a transação venha a se tornar evicta, a obrigação extinta pela transação não renasce. Ao evicto cabe o direito de reclamar perdas e danos.

10. OBRIGAÇÕES RESULTANTES DE DELITO

Já foi estudado que os diversos ramos do Direito possuem autonomia, mas em algumas situações podem sofrer uma intersecção, desde que autorizada por lei. É o caso das pessoas mesmo causando prejuízos a outrem, mas se comprovado o exercício da legítima defesa, não deveram indenizar a vítima.

Em outra situação, temos que a absolvição criminal por comprovada ausência de autoria exime o indivíduo de indenizar a vítima. Ou ainda, a sentença penal condenatória faz coisa julgada no cível.

Via de regra, as decisões penais acabam por invadir seara civil, mas o contrário nem sempre ocorre, principalmente quando autor do delito e vítima transacionam uma indenização no juízo cível. Tal transação não impedirá o transcorrer do processo penal. O que poderá ocorrer é uma atenuação da pena, em alguns casos.
[1] Apesar de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona restringirem a transações a direitos privados, aplicando o que dispõe o art. 841 do CC, ouso discordar dos renomados juristas, bem como do Legislador ordinário, pois o art. 156, III do CTN permite o uso da transação como forma de extinção do crédito tributário, este de natureza pública, portanto ao meu ver também cabe transação sobre direitos patrimoniais públicos, desde que exista prévia autorização legislativa;
[2] “Exige-se autorização judicial quando a transação é entabulada pela mãe de menor impúbere, quando verse sobre indenização paga em virtude do falecimento do pai.”(RT 804/243)
[3] Humberto Theodoro Jr. destaca que: “se o negócio jurídico da transação já se acha concluído entre as partes, impossível é a qualquer delas o arrependimento unilateral, mesmo que ainda não tenha sido homologado o acordo em juízo.”
[4] “Transação. Homologação.Inadmissibilidade se há cláusula nula ou ineficaz, ligada aos demais pontos da transigência. Eiva parcial que contamina o acordo por inteiro.”(RT 771/290).

PAGAMENTO INDEVIDO


1. CONSIDERAÇÕES GERAIS

O pagamento indevido tem como pressuposto, na maioria das vezes, uma violação do princípio da boa fé, mas também poderá decorrer de erro, culpa ou descuido das partes, mas nesses casos haverá necessidade de prova. No Direito Tributário,o contribuinte que faz o pagamento indevido, por mero erro, não precisa fazer prova se o fato se deu por ser ilegal ou inconstitucional a exação, mas os juros só são devidos a partir do trânsito em julgado da ação.

Mas em todo caso, independentemente do motivo que acabou por ensejar o pagamento indevido de uma obrigação, o art.876 do CC determina que todo aquele que recebeu o que lhe não era devido fica obrigado a restituir. Tal restituição deve ser acompanhada da devida correção monetária a ser contada a partir do recebimento indevido, no intuito de não causar enriquecimento indevido.

O pagamento indevido de uma obrigação de fazer ou não fazer, pelo fato de não poder se voltar atrás, como por exemplo, no dever de abstenção, o art. 881 do CC estabelece que o que recebeu tal pagamento tem o dever de indenizar a outra parte, na medida do eventual lucro obtido.

Jurisprudência:

“Contrato. Prestação de serviços bancários. Ação de repetição de indébito. Transferência em duplicidade, por erro, de quantia da conta de correntista para conta de terceiro. Obrigação de restituir o pagamento indevido. Exegese do art. 876 do Código Civil. Recurso improvido nessa parte.” (TJSP, AP. Civ. Nº 1.289.918-2/SP, 11ª Câm. De Direito Privado, rel. Des. Gilberto dos Santos, j. 15.02.2007).

“Condomínio. Centro Comercial.Taxa de publicidade. Alegação de pagamento indevido porque a unidade autônoma não está sendo utilizada. Inconsistência. Restituição do Indébito julgada improcedente. Convenção condominial que não exclui as unidades desocupadas. Recurso improvido.” (TJSP, AP. nº 331.483.4/7, rel. Des. Álvares Lobo,j. 31.3.2004)

“Aquele que recebeu o que não era devido deve restituir, sendo certo que não se pode considerar pagamento voluntário quando é efetuado para evitar possíveis constrangimentos.”(STJ, REsp nº 187.281, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, j. 19/11/1999).

“Em se tratando, como na espécie, de contrato de abertura de crédito em conta-corrente, o pedido de restituição dos valores pagos a maior não exige a prova do erro, pois não o que se falar em pagamento voluntário, já que os débitos são lançados na conta pela própria instituição financeira credora.” (STJ, REsp. 184,237, rel. Min. Cesar Asfor Rocha, j. 5.10.2000)

2. ESPÉCIES DE PAGAMENTO INDEVIDO

As espécies de pagamento indevido podem variar de acordo com o objeto ou quanto à pessoa.

a) Pagamento indevido quanto ao objeto: Ocorre quando há erro quanto à existência ou extensão da obrigação. Ex.:. Um consumidor decide, na 5ª parcela, efetuar a quitação do financiamento de seu veículo, feito em 36 meses. Ao se dirigir à Itaú Financeira, informam que ele, para poder quitar, deverá pagar uma tarifa de quitação de contrato. Se ele efetuar o pagamento o estará fazendo de forma indevida, tal como vem sendo decidido pelos Tribunais[1];
b) Pagamento indevido quanto a pessoa: O devedor paga à pessoa errada. Ex. Imaginem que a empresa de TV a cabo, Net, tenha adquirido a empresa local de TV a cabo, Big TV. O consumidor costumava deixar os pagamentos das faturas direto com débito em conta e, num determinado mês, ele pagou a fatura da Net e também houve o débito da fatura da Big TV. Nesse caso, o pagamento foi indevido quanto ao objeto, pois não deveria ser pago nada à Big TV, apenas à Net

Embora a máxima do Direito diga que “quem paga mal, paga duas vezes”, o devedor não perderá o direito de reaver judicialmente o que pagou indevidamente e em dobro, como expresso nos artigos 940 do CC e 42 do CDC.

3. BOA FÉ NO PAGAMENTO INDEVIDO

Como já dissemos, como regra, o pagamento indevido está ligado a má-fé, mas podem ocorrer as seguintes situações:

a) se o bem, indevidamente recebido, fora transferido a um terceiro, de boa-fé, e a título oneroso, o alienante ficará obrigado a entregar ao legítimo proprietário a quantia recebida;
b) se o bem, indevidamente recebido, fora transferido a um terceiro, de má-fé, e a título oneroso, o alienante ficará obrigado a entregar ao legítimo proprietário a quantia devida;
c) se o bem fora transferido ao terceiro, a título oneroso, estando este último de má-fé, caberá ao que pagou por erro o direito à reivindicação;
d) se o bem fora transferido ao terceiro, a título gratuito, caberá ao que pagou ou erro o direito à reivindicação.

As hipóteses acima aplicam-se também aos frutos, acessões, benfeitorias e deteriorações sobrevindas à coisa dada em pagamento indevido.

4. INEXISTÊNCIA DE DIREITO DE REAVER O QUE PAGOU INDEVIDAMENTE

Se o devedor efetuar o pagamento de dívida já prescrita, dívida de jogo, cumprir obrigação judicialmente inexigível, ou deu alguma coisa para obter fim ilícito, imoral, ou proibido por lei, não terá direito à restituição.

Imaginem numa situação no qual um contribuinte, necessitando obter certidões negativas junto à Receita Federal, paga R$ 50.000,00 a um intermediário que lhe prometeu as certidões. Depois de um tempo, o intermediário disse que seu contato interno na Receita Federal não pode mais conseguir. Nesse caso, o contribuinte “espertalhão” levou um prejuízo que não mais poderá, pelas vias normais, cobrar o Intermediário.

Fica isento de restituir pagamento indevido aquele que, recebendo-o como parte de dívida verdadeira, inutilizou o título, deixou prescrever a pretensão ou abriu mão das garantias que asseguravam seu direito; mas aquele que pagou dispõe de ação regressiva contra o verdadeiro devedor e seu fiador.
[1] Os nomes e exemplos não são fictícios.